Esta página tem por finalidade colocar à disposição dos meus alunos da Escola Teológica Rev. Celso Lopes o material referente às aulas da matéria título do blog.

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Aula 4 - A REVOLUÇÃO PURITANA


A Assembléia de Westminster

Aula 4
“O magistrado civil não pode tomar para
si a administração da Palavra e dos Sacramentos...
Tem, sim, a autoridade e obrigação de ver
que se conservem em toda a Igreja a unidade
e a paz, que a verdade de Deus seja mantida pura
e íntegra, que todas as heresias e blasfémias
sejam tiradas e que todas as corrupções e abusos
no culto sejam reparados e evitados”.
Confissão de Westminster

Vimos anteriormente a história do cristianismo na Inglaterra até o reinado de Isabel e vimos também como essa rainha conseguiu estabelecer um equilíbrio entre os elementos conservadores, que desejavam reter, tanto quanto fosse possível, das antigas práticas católicas e dos protestantes de tendências calvinistas, para quem era necessário que toda vida e a organização da igreja se ajustassem ao que criam serem as normas bíblicas.
Na vida de Isabel, esse equilíbrio conseguiu manter-se. Mas as tensões existentes na situação se manifestaram, repetidamente, e só a mão forte da Rainha e de seus ministros pôde pôr-lhes fim.

James I
Isabel morreu em 1603, sem deixar descendência e, em suas últimas instruções, indicou que seu sucessor devia ser o fi¬lho de Maria Stuart, James que já governava na Escócia. A transição aconteceu sem maiores dificuldades, e assim começou a reinar na Inglaterra a casa dos Stuart.
Todavia, James (o primeiro rei desse nome na Inglaterra, mas o sexto da Escócia) tinha que enfrentar grandes dificuldades. Primeiramente, os ingleses sempre o consideraram estrangeiro. O plano do Rei de unir ambos os reinos, ainda que depois tenha dado resultado, de início lhe criou inimigos tanto na Inglaterra como na Escócia.
Ao mesmo tempo, as sólidas bases em que Isabel havia fundado o comércio começavam a dar frutos, e isso lhe dava maior fama na classe mercantil e burguesa. Mas a política de James, tanto no campo internacional como no interno, não era do agrado dessa classe que esperava que a coroa estabelecesse uma ordem internacional que a favorecesse, ainda que não estivesse disposta a sacrificar-se em prol dessa ordem.
Um exemplo característico desse conflito pode ser visto no caso da Guerra dos Trinta Anos, onde, como vimos, a participação (ou melhor, a falta de participação) da Inglaterra foi vergonhosa. Deles se queixavam os comerciantes ingleses, em sua maioria protestantes, para quem o curso da guerra parecia uma ameaça, tanto à sua religião como a seus bolsos. Mas, ao mesmo tempo, seus representantes no Parlamento negavam-se a aprovar os impostos necessários para intervir decisivamente nos conflitos que aconteciam na Alemanha.
Por esta e outras causas, durante todo o reinado de James e de seu filho sucessor, Carlos l, foi aumentando a oposição à coroa por parte daqueles protestantes que pensavam que a Reforma não havia se expandido suficientemente na Inglaterra, e que isso devia-se em boa medida à política dos reis e seus conselheiros.
Estes protestantes radicais não estavam organizados em um só grupo e, portanto, é difícil descrevê-los com exatidão. O nome que se lhes deu foi o de "puritanos", porque insistiam na necessidade de regressar à pura religião bíblica. Ainda que nem todos concordassem em alguns detalhes, no geral os puritanos opunham-se a muitos elementos do culto tradicional que a Igreja Anglicana havia conservado. Entre esses elementos estavam o uso da cruz no culto, certas vestimentas sacerdotais e a questão da comunhão ser celebrada em uma mesa ou em um altar, a qual implicava em diversas interpretações do sentido da comunhão e levava a longas discussões acerca de onde deveria ser colocada essa mesa ou altar.
Ao mesmo tempo, os puritanos insistiam na necessidade de levar uma vida sóbria, segundo os mandamentos bíblicos. Sua oposição a boa parte do culto oficial relacionava-se com a pompa que fazia parte dele, pois, para eles, todo luxo ou ostentação devia ser evitado. Muitos insistiam na necessidade de guardar o Dia do Senhor, dedicando-se exclusivamente aos exercícios religiosos e à prática da caridade. Ainda que uns poucos fossem "sabatistas", estes guardavam o sábado, a imensa maioria guardava o domingo. Sem se oporem absolutamente ao uso do álcool, pois muitos deles bebiam com moderação, criticava-se a embriaguez de alguns ministros. O teatro, o qual frequentavam, apresentava gracejos de duplo sentido, os esportes que se celebravam no Dia do Senhor e, em geral, os costumes licenciosos, eram objeto especial de seus ataques.
Muitos dos puritanos opunham-se ao episcopado, dizendo que os bispos, pelo menos como existiam em sua época, eram uma invenção posterior à Bíblia, onde a igreja era governada de outro modo. Os mais moderados simplesmente diziam que, na Bíblia, se falava de diversos modos de governar a igreja e que, portanto, o episcopado, ainda que pudesse ser bom, não era "de direito divino", isto é, não era parte necessária da Igreja, como o Novo Testamento a descrevia. Outros insistiam em que a igreja do Novo Testamento governava-se mediante "presbitérios", isto é, grupos de anciãos, e que tal governo era necessário em uma igreja verdadeiramente bíblica. Outros afirmavam a independência de cada congregação e, portanto, passou-se a chamar-lhes "independentes". Entre estes últimos — além dos "sabatistas" - havia quem cresse que o batismo devia reservar-se aos adultos e, portanto, receberam o nome de "batistas". Ainda que todos estes grupos não concordassem entre si, no geral inspiravam-se em ideias de Calvino, Zwinglio e demais reformadores suíços. Posteriormente, alguns dos mais radicais se inspiraram também nos anabatistas do Continente.
Entretanto, na igreja oficial acontecia uma evolução paralela, mas em sentido contrário. O equilíbrio isabelino havia se aperfeiçoado, estabelecendo-se uma igreja cuja teologia era um calvinismo moderado e, não obstante, conservava em seu culto todos os elementos tradicionais que não se chocavam diretamente com sua nova teologia.
Mais adiante, falaremos do Sínodo do Dordrecht, onde se reuniram calvinistas de diversos países para determinar o que, desde então, seria a ortodoxia reformada. A esse Sínodo assistiram delegados da Igreja da Inglaterra que, com isso, se declarou parte da fraternidade internacional das igrejas calvinistas. Mas o acerto isabelino não podia perdurar. Para defender o culto tradicional, logo se começou a abandonar alguns dos princípios calvinistas. Alguns dos mais importantes teólogos da igreja oficial sentiam-se tão surpreendidos pela beleza do culto que pareciam prestar pouca atenção à necessidade de ajustá-lo à fé bíblica. Rapidamente, alguns puritanos começaram a temer que se organizasse um movimento para retornar ao romanismo.
Tudo isto existia já em embrião, quando James I herdou a coroa de Isabel. A partir daí, os conflitos que já estavam latentes se fariam cada vez mais violentos. Os puritanos temiam o novo soberano, James, filho da católica Maria Stuart. Apesar de tais suspeitas, James não favoreceu aos católicos, que, desde o princípio de seu reinado, solicitaram varias concessões, sem maiores resultados. Seu ideal era a monarquia absoluta que existia na França e que, na Escócia, os presbiterianos não o haviam permitido implantar. Possivelmente, em razão desses conflitos com o presbiterianismo escocês, James estava convencido da necessidade de apoiar o episcopado para ter uma base desustentação. Segundo o próprio Rei dizia, "sem bispos não há rei".
O caráter pessoal de James contribuiu para o seu próprio desprestígio. Era homossexual e seus favoritos gozavam de enormes privilégios em sua corte e em seu governo. Ao mesmo tempo que queria ser rei absoluto, oscilava entre uma rigidez caprichosa e uma debilidade covarde. Ainda que manejasse suas finanças honradamente, era pródigo em gastos desnecessários e, frequentemente, faltavam fundos para os projetos de primeira necessidade. Deu títulos e poderes a seus amigos com uma liberalidade que ofendia aqueles que haviam servido a coroa por longo tempo. E muitos desses amigos mostravam-se incapazes de enfrentar as responsabilidades colocadas sobre eles.
James tratou de seguir uma política religiosa semelhante a de Isabel. Os únicos que foram perseguidos com certa constância foram os anabatistas, cujas idéias políticas lhe causavam terror. Os católicos eram vistos como pessoas leais ao Papa e, portanto, como possíveis traidores. Mas, se o papa reconhecia o direito de James de reinar e condenava o regicídio, que alguns católicos extremistas propunham, o Rei estava disposto a tolerar os católicos em seus reinos. Quanto aos presbiterianos, o Rei inclinava-se a tolerá-los e a até fazer-lhes algumas concessões. Mas, não podia abandonar o sistema episcopal de governo, pois estava convencido (e era certo) que os bispos estavam entre os mais decididos e úteis defensores da coroa.
Durante todo reinado de James, foi aumentando a inimizade entre a alta hierarquia da igreja oficial e os puritanos. Em 1604, Bancroft, o arcebispo de Canterbury, fez aprovar uma série de cânones em que se afirmava que a hierarquia dos bispos era uma instituição de origem divina, sem a qual não podia haver verdadeira igreja.
Tal afirmação implicava num retrocesso das igrejas protestantes do Continente, muitas das quais não tinham bispos e, portanto, foram vistas pelos puritanos como o princípio de um processo destinado a reintroduzir o romanismo na Inglaterra. Além disso, vários dos 141 cânones aprovados a pedido do Arcebispo eram dirigidos contra os puritanos.
O Parlamento estava em sessão, pois James teve que convocá-lo para que aprovasse uma série de impostos que o tesouro real necessitava. Mas, particularmente, na Câmara Baixa ou dos Comuns, havia muitos puritanos que se somaram a outras pessoas de semelhante convicção, para apelar ao Rei. James convocou uma conferência, que se reuniu em Hampton Court, que ele mesmo presidiu. Quando um dos puritanos referiu-se de passagem a um "presbitério", o Rei declarou que "um presbitério se harmoniza tanto com a monarquia como Deus se harmoniza com o Diabo". Todo intento de chegar a um acordo fracassou, e o único resultado daquela conferência foi a nova tradução da Bíblia que apareceu em 1611 e que se conhece como "Versão King James".
A partir de então, manifestou-se uma crescente inimizade entre a Câmara dos Comuns e os elementos mais resistentes do episcopado. Estes se aliaram à coroa, afirmando que tanto os bispos como os reis exerciam suas funções por direito divino. Em 1606, aprovou-se uma série de cânones ainda mais repressivos que os anteriores. O Parlamento respondeu atacando, não diretamente ao Rei e ao Arcebispo, senão aos mais imprudentes entre seus defensores. Por último, durante o reinado seguinte, o conflito levaria à guerra civil.
Entretanto, em fins de 1605, produziu-se a famosa "Conspiração da Pólvora". No ano anterior, havia-se ditado uma lei repressora contra os católicos, sob o pretexto de que eram leais ao papa e não ao trono. A mesma lei decretava penas maiores, mas o interesse do Estado era quebrar o poder dos católicos e recolher fundos e, portanto, muitos condenados viram-se obrigados a pagar fortes multas, ou perderiam seus bens. Em todo caso, alguns dos católicos chegaram à conclusão de que era necessário desfazer-se do Rei. Um deles alugou uma adega que se estendia sob o local onde se reunia o Parlamento.
O plano era introduzir nela barris de pólvora como se fossem de vinho, e fazê-los voar quando o Rei estivesse abrindo a sessão seguinte da Assembleia. Desse modo, pereceriam o soberano e boa parte dos puritanos do Parlamento. Mas a trama foi descoberta. Os principais conspiradores e muitos outros cuja participação no complô não se comprovou, foram executados. Em algumas partes do país, houve perseguição aos católicos. O próprio Rei parece ter tratado de distinguir entre os culpados e os inocentes. Mas não deixou de aproveitar a ocasião para que se impusessem mais multas e confiscações. Assim, houve milhares de católicos encarcerados.
Através dos conflitos dos seus primeiros anos de reinado, James tratou de governar sem o Parlamento. Mas somente essa assembleia tinha direito de determinar novos impostos e, por fim, em 1614, o Rei viu-se obrigado a convocá-la novamente, pois sua situação financeira era desesperadora. As novas eleições resultaram numa Câmara dos Comuns, ainda menos disposta que a anterior a dobrar-se ao Rei e aos bispos e, portanto, James a dissolveu e tratou de dar uma solução aumentando aquelas taxas que tinha direito a impor e solicitando empréstimos dos nobres e dos bispos.
Estourou, então, a Guerra dos Trinta Anos. O eleitor do Palatinado, Federico, havia aceitado a coroa da Boêmia, contando com o apoio de James, que era seu sogro. Mas o Rei da Inglaterra não veio em seu auxílio, e muitos protestantes, para quem Federico era um herói, concluíram que James era um covarde e um traidor. O mínimo que o Rei poderia fazer era apoiar economicamente os protestantes da Alemanha, mas, como dissemos, carecia de fundos e não podia recebê-los sem o acordo do Parlamento. Por fim, em 1621, o Rei convocou novamente esse corpo legislativo, com a esperança de que, em vista das necessidades dos protestantes alemães, apro¬vassem os impostos necessários.
Contudo, ao tempo em que James convocava o Parlamento, fazia também esforços para casar seu filho Carlos com uma infanta da Espanha. A possibilidade de tal aliança com a Casa de Áustria era um escândalo para os puritanos do Parlamento, que aprovaram pequenas somas e logo passaram a apresentar seus agravos ante a coroa. Irritado, o Rei encarcerou vários dos dirigentes dos Comuns e declarou dissolvida a legislatura.
O projetado matrimónio não chegou a concretizar-se e, em 1624, James voltou a convocar o Parlamento, para ter que dissolvê-lo no ano seguinte, sem ter conseguido os subsídios que a coroa necessitava. Pouco tempo depois, o Rei morreu e o sucedeu seu filho, Carlos.

Carlos I
O novo rei era tão partidário da monarquia absoluta como o havia sido seu pai, e por isso logo se chocou com o Parlamento. Este mostrava-se desconfiado, porque atrás do fracasso da última proposta de casamento, Carlos havia se casado com a princesa Henriqueta Maria, irmã de Luis XIII, da França. Como parte das negociações desse matrimónio, haviam sido feitas várias concessões aos católicos ingleses, e havia sido prometido à nova rainha e a seu séquito, que poderiam continuar praticando sua religião. Muitos dos puritanos viam em tais concessões o regresso da idolatria ao país e queixavam-se de que agora a apostasia tinha apoio no palácio real. Logo houve quem compa¬rasse a Rainha com Jezabel, todavia, somente em círculos privados.
Carlos herdou de seu pai os conflitos com o Parlamento em matéria religiosa. Pouco antes de morrer, James havia posto fim às pregações dos puritanos, decretando que era permitido pregar somente em certas oportunidades e sobre certos tópicos. Além disso, em 1618, promulgou o Código dos Desportes, que devia ser lido em todas as igrejas, e que rebatia a tese dos puri¬tanos sobre o modo de guardar o Dia do Senhor.
Todos os receios entre o Parlamento e a coroa manifestaram-se no processo de Richard Montague. Este era um forte adversário dos puritanos, contra os quais publicou vários livros em tom mordaz e depreciativo. Era também defensor do direito divino dos reis. Em função da publicação de um dos seus livros mais ofensivos contra o Parlamento, a Câmara dos Comuns exigiu o seu comparecimento diante dela, instaurou processo e o condenou a prisão e multa. Mas o Rei Carlos I, oportunamente, livrou-o da condenação, nomeando-o seu capelão. O Parla¬mento irritou-se e, prontamente, sua hostilidade dirigiu-se ao Duque de Buckingham, ministro da coroa, a quem se falava de processar por delito de alta traição.
O Rei declarou dissolvida a Assembleia Parlamentar. Mas, igualmente ao seu pai, que o precedeu, necessitava de fundos que unicamente o Parlamento podia votar. Muitos dos bispos correram em sua ajuda, e houve numerosas pregações acerca da necessidade de se apoiar o Rei. Mas os fundos iam-se escasseando, e o soberano teve que recorrer a medidas cada vez mais coercivas. O partido dos bispos declarou-se favorável às teses mais exageradas sobre os direitos dos reis. O Arcebispo de Canterbury, que tratava de tomar medidas conciliatórias frente aos puritanos, viu-se privado de quase todos os seus poderes, concedidos pelo Rei a uma comissão sob a presidência de William Laud, um dos mais decididos adversários do puritanismo.
Repetidamente, por falta de fundos, o Rei convocou o Parlamento. Mas sempre se viu obrigado a declará-lo dissolvido, pois a Câmara dos Comuns insistia em tratar dos pontos de conflito antes de votar os fundos que o trono requeria. Aos maiores partidários da Câmara dos Comuns, Carlos nomeou lordes, com o que os apartou da posição em que podiam prestar-lhe maior apoio. A Câmara Baixa, desprovida dos realistas mais decididos, foi se tornando cada vez mais radical. Entretanto, muitos dos velhos lordes, ofendidos pelas honras dadas aos novos mem¬bros da Câmara dos Lordes, apartaram-se também da causa do Rei. Quando, em 1629, o Rei declarou dissolvido o terceiro Parlamento do seu reinado, estava disposto a governar sem esta assembleia legislativa e voltou a convocá-la somente onze anos mais tarde.
Esses onze anos de governo pessoal de Carlos l foram uma época de prosperidade para as classes elevadas do país. Porém, a alta dos preços foi muito mais rápida que a dos salários e, portanto, a maioria da população sentiu-se cada vez mais oprimida pela ordem existente.
Para obter os fundos de que necessitava, Carlos fazia concessões aos poderosos, que, por sua vez, oprimiam aos pobres. Ainda que o rei desse mostra de interesse por eles e tomasse algumas medidas para aliviar sua situação, o fato era que a ordem social e política causavam mais desgraças que as fra¬cas medidas do rei não podiam reparar. Cada vez mais e particularmente nas regiões industriais, o Rei e os bispos, que apoiavam sua causa dando-lhe aprovação religiosa, eram vistos como inimigos do povo. Ao mesmo tempo, os puritanos que atacavam os excessos da coroa e dos bispos, ganhavam popularidade.
Em 1633, William Laud foi feito arcebispo de Canterbury. Era um homem cuidadoso com a beleza do culto e convencido de que o bem estar social requeria uma igreja monolítica. Suas medidas contra os puritanos foram cada vez mais cruéis, e não faltaram penas de morte nem mutilações ordenadas por ele. Carlos cometeu o erro de dar-lhe plenos poderes sobre a Escócia, on¬de Laud tratou de impor a liturgia e outros elementos da Igreja Anglicana. Isto deu motivo a um motim, que logo se tornou rebelião.
Quando a Assembleia Geral da Escócia quis limitar o poder dos bispos, as autoridades reais a declararam dissolvida. Mas a Assembleia negou-se a obedecer a ordem real e respondeu decla¬rando nulo o episcopado e reorganizando a Igreja da Escócia sobre bases mais calvinistas e presbiterianas.
Dada a atitude da Assembleia Geral da Escócia, a guerra era inevitável. O Rei necessitava de exércitos e de fundos para sustentá-la e, portanto, decidiu apelar ao seus súditos irlandeses, entre os quais o catolicismo e os sentimentos anticalvinistas eram fortes. Para isso, contou com o apoio da Rainha que continuava católica. Mas tais medidas serviram somente para criar laços entre os calvinistas escoceses e os puritanos ingleses. O resultado foi que, quando o Rei convocou o Parlamento inglês para que votasse fundos para a guerra contra os rebeldes escoceses, viu-se obrigado a dissolvê-lo em poucos dias de reunião. Este foi o chamado "Parlamento Curto" de 1640. Animados por tais acontecimentos, os escoceses invadiram o território inglês e, diante deles, as tropas do Rei bateram em reti¬rada. Uma vez mais, ao Rei não lhe restou outro remédio senão convocar novamente o Parlamento. Essa assembleia legislativa, que começou suas sessões em novembro de 1640, receberia de¬pois o nome de "Parlamento Longo" e seria de grande importância para a história da Inglaterra.

O Parlamento Longo
Os últimos anos antes da convocação dessa nova assembleia, tinham trazido dificuldades económicas. Os desajustes sociais e económicos, que antes haviam prejudicado unicamente os pobres e os trabalhadores, começaram a afetar também os co¬merciantes e industriais. Logo, quando ocorreram as eleições para o Parlamento, a maioria representava o descontentamento com a coroa, tanto por razões económicas como por motivos religiosos. E isso acontecia, não apenas com os comuns, mas também com os lordes, que, em tempos recentes, haviam-se unido à nova classe burguesa em empresas mercantis.
O novo Parlamento, imediatamente, mostrou-se mais resistente que os anteriores. O Rei o tinha convocado para que votasse fundos que permitissem organizar um exército e expulsar do território inglês os rebeldes escoceses. Mas os parlamentares sabiam que o seu poder devia-se precisamente à presença desses escoceses em solo inglês e não se mostravam dispostos a resolver essa situação com muita rapidez.
Primeiro, preocuparam-se em tomar medidas contra os que, em anos recentes, haviam tentado destruir o puritanismo. As vítimas do arcebispo Laud, que ainda viviam, foram postas em liberdade e receberam indenizações. Lorde Strafford, um dos ministros mais fiéis ao Rei, foi processado e condenado à morte sem que o soberano fizesse muita coisa para salvá-lo.
Depois, o Parlamento tratou de assegurar-se que suas medidas teriam valor permanente. Em maio de 1641, aprovou uma lei segundo a qual a assembleia não podia ser dissolvida pelo Rei, sem a anuência de seus membros. Ainda que tal lei o privas¬se de muitos de seus poderes, Carlos fez pouco por evitá-la, pois tinha decidido resolver suas dificuldades mediante uma série de intrigas que não cabe relatar aqui. Quando, por fim, o Parlamento começou a tomar medidas para arrecadar os fundos necessários para expulsar os escoceses, soube-se que Carlos estava se aliando a eles. Mas os escoceses, que eram calvinistas, sa¬biam que o parlamento inglês lhes era muito mais favorável do que o Rei e, por isso, as empresas do soberano fracassaram.
Pela mesma época, os católicos irlandeses rebelaram-se e não faltou no Parlamento quem acusasse a Rainha de animar a insurreição. Em vista da duplicidade, tanto real como suposta dos soberanos, os protestantes mais radicais uniram-se em um grupo decidido a limitar mais o poder da coroa.
Os bispos, como membros da Câmara dos Lordes, eram o principal apoio de Carlos no Parlamento. Mas a Câmara dos Comuns iniciou processo contra vários deles. Quando os bispos intentaram participar das reuniões do Parlamento, o povo de Londres amotinou-se e os impediu o acesso na Assembleia. Animados por tais êxitos, os radicais entre os puritanos anunciaram que preparavam um processo contra a Rainha, a quem acusavam de ter causado as desordens na Irlanda.
Essas medidas extremas começaram a produzir uma reação contra os puritanos. Entre os lordes, muitos pensavam que era hora de restaurar a normalidade. Provavelmente, se Carlos tives¬se sido mais comedido e paciente, o tempo lhe daria a vitória. Mas o Rei "perdeu as estribeiras". Acusou ante a Câmara dos Lordes, os principais chefes dos Comuns, mas a câmara alta rebateu a acusação. Quando o Rei ordenou a detenção dos acusados, os parlamentares se negaram a entregá-los. No dia seguinte, um contingente militar enviado pelo Rei para deter os acusados, encontrou os que tinham fugido e buscado refúgio em Londres, de onde voltaram a se reunir para continuar suas sessões. Desde então, o chefe dos rebeldes, John Pym, governava como "rei sem coroa". Perdida a capital, o Rei retirou-se a seus palácios de Hampton Court e Windsor.
A Câmara dos Comuns propôs, então, uma lei que excluía os bispos da Câmara dos Lordes. Tal lei vingou, o rei não pôde por reparos, e os prelados foram expulsos. Desse modo, começa¬va um processo que iria excluindo do Parlamento os elementos opostos ao puritanismo e que, portanto, daria à assembleia um caráter cada vez mais radical.
Por fim, o Parlamento deliberou que se recrutasse uma milícia. Posto que estas tropas estariam sob o comando do Parlamento, e não do Rei, este decidiu que havia chegado o momento de tomar açâo decisiva. Reuniu as tropas que pôde, desfraldou seu estandarte e preparou-se para lutar contra as milícias parlamentares. Os conflitos entre a coroa e o Parlamento haviam levado, por fim, à guerra civil.

A Guerra Civil
Tanto o Rei como o Parlamento se dedicaram, imediatamente, ao recrutamento de suas tropas. Carlos encontrou seu principal apoio entre os nobres. O Parlamento, por sua parte, recrutou seus soldados entre as classes que mais haviam sofrido durante os últimos anos. Os trabalhadores e os desempregados foram o grosso desse exército, ao que se somaram os comerciantes. A força de Carlos estava principalmente na cavalaria, corpo tradicionalmente recrutado entre a nobreza. A do Parlamento estava na infantaria e na frota marítima, para o qual o comércio era importante.
A princípio, os exércitos rivais se limitaram a marchas e contra-marchas, que não produziram mais que algumas conten¬das. Entretanto, cada partido buscava outros pontos de apoio. Como era de se esperar, os parlamentares se achegaram aos esco¬ceses. Isso, por sua vez, obrigou a Carlos buscar ajuda entre os católicos irlandeses. Essas atitudes por parte do Rei, sem dúvida, resultaram em seu prejuízo, pois as diversas facções entre os puritanos uniram-se ante a ameaça de uma intervenção católica.
Em seus esforços de aproximar-se dos escoceses, o Parlamento viu-se obrigado a tomar medidas que o levavam rumo ao presbíterianismo. Esse tipo de organização eclesiástica que prevalecia na Escócia, não era bem vista por todos os ingleses. Ademais, embora muitos acreditassem que o episcopado era parte necessária da igreja, havia outros que preferiam um governo eclesiástico do tipo congregacional — os "independentes".
A maioria parece haver pensado que, ainda que o episcopado não se opusesse necessariamente às Escrituras, constituía-se no principal aliado da monarquia e, portanto, era necessário aboli-lo. Segundo alguém disse: "os que odeiam os bispos, os odeiam mais que ao Diabo, e os que gostam deles, gostam menos que sua comida".
Posteriormente, o episcopado foi abolido, em parte porque era partidário do Rei, em parte por razões teológicas e, em parte, porque, confiscando suas rendas, o Parlamento podia obter fundos sem criar novos impostos.
Entretanto, o Parlamento convocou uma assembleia de teólogos para o aconselhar em matéria religiosa. Esta é a famosa Assembléia de Westminster, que continha, além de cento e vinte e um ministros e trinta leigos nomeados pelo Parlamento, oito comissários escoceses. Visto que os escoceses representavam, naquele momento, o mais forte exército que existia na Grã-Bretanha, o valor de seus comissários na Assembleia foi decisivo. Mais para frente, teremos oportunidade de voltar ao conteúdo teológico da Assembléia de Westminster, cuja Confissão veio a ser um dos principais documentos da ortodoxia calvinista. Rapidamente, basta assinalar que, embora alguns de seus membros fossem independentes, e outros se inclinassem frente ao episcopado, logo a Assembleia dediciu-se a favor da forma presbiteriana de governo eclesiástico e a recomendou ao Parlamento que a estabelecera.
Esse corpo, no qual havia bom número de independentes, não tendia, a princípio, dirigir-se ao presbiterianismo. Mas a marcha da guerra obrigou-o a formar com os escoceses uma Solene Liga e Pacto, que o comprometia a dirigir a organização da igreja para o presbiterianismo. Este foi estabelecido em 1644 e, no ano seguinte, o arcebispo Laud foi executado por ordem do Parlamento. Tudo isso deu tempo aos puritanos para formarem seu próprio exército, com o qual enfrentariam o do Rei.
Foi nessa época que recebeu proeminência o puritano Oliver Cromwell. Este era um homem relativamente acomodado, descendente de um dos conselheiros de Henrique VIII. Uns poucos anos antes, havia abraçado o puritanismo e era um assíduo estudioso da Bíblia. Para ele, toda decisão, tanto política como pessoal, devia ser tomada indagando-se seriamente qual a vontade de Deus. Por isso, ainda que frequentemente vacilasse antes de tomar uma decisão, uma vez decidido, mostrava-se inflexível em seu rumo. Não era orador, nem pessoa dada aos sofismas políticos. Mas a profundidade e firmeza de suas convicções, logo lhe atraíram o respeito dos demais puritanos. Até o começo da guerra civil, não havia tido mais participações nos conflitos de seu tempo do que algumas intervenções nos debates da Câmara dos Comuns, da qual era membro.
Ao ver que os acontecimentos levavam à luta armada, Cromwell regressou às suas terras onde recrutou um pequeno contingente de cavalaria. Estava convencido de que a principal arma do Rei era sua cavalaria, e que o Parlamento tinha necessidade de um corpo semelhante. Seus soldados se inflamaram com o zelo de seu chefe e, prontamente, aquele núcleo tornou-se um grande corpo de cavalaria. Para eles, e depois para boa parte do exército parlamentário, o que estava ocorrendo era uma guerra santa. Antes de marchar para o combate, liam as Escrituras e oravam, e depois cantavam salmos em meio à luta. Repetidamente, derrotaram os realistas que foram, por fim, aniquilados na batalha de Naseby.
Todavia, aquela batalha teve consequências piores para o Rei, pois os rebeldes tornaram-se donos do acampamento real onde se apoderaram de documentos que provavam que Carlos havia negociado com os irlandeses e com outros para fazer desembarcar na Inglaterra tropas católicas e estrangeiras. Desde então, começou a crescer o partido dos que propugnavam a deposição do Rei.
Em meio a seus infortúnios, Carlos decidiu recorrer a seus súditos escoceses, pensando ganhá-los com diversas promessas. Mas os escoceses o fizeram prisioneiro e, através de uma série de negociações, o entregaram ao Parlamento.
Parecia, assim, que a guerra civil havia terminado. Os puritanos haviam prevalecido sobre o partido dos bispos e do Rei, e se dedicaram a implantar suas reformas. Promulgaram-se leis ordenando que se dedicasse o Dia do Senhor aos exercícios religiosos, e se legislou também acerca dos costumes e dos passa¬tempos frívolos. Assim, houve quem se queixasse de uma ditadu¬ra puritana.
Mas os puritanos, unidos quando se tratava de opor-se ao Rei e aos bispos, viram sua unidade desvanecer-se tão rápido como se fizeram vencedores. Em síntese, havia dois partidos: o dos presbiterianos, que contava com a maioria do Parlamento, advogava por uma igreja nacional e uniforme, porém constituída, não segundo os princípios episcopais, mas segundo os do presbiterianismo; e os independentes, particularmente numerosos no exército, pertenciam a diversas seitas, cada qual com o seu ponto de vista. Mas todos os independentes concordavam em que não devia haver uma igreja uniforme para todo o país e que se devia permitir que cada grupo seguisse seu curso, ou sua forma de governo, independentemente dos demais, sempre que não violassem os princípios bíblicos, nem ofendessem a moral. Ambos os partidos concordavam em desfazer-se dos bispos e em limitar o poder do Rei. Mas, uma vez cumprido esse pro¬pósito, seus programas eram tão distintos que tinham que se chocar.
Tudo isto deu lugar a crescentes tensões entre o exército, em sua maioria independente, e o Parlamento que buscava a uniformidade mediante a fórmula presbiteriana. Em 1646, o Parlamento tratou de despedir o exército, mas este negou-se a de¬bandar. Em meio ao conflito, adquiriram força no exército movimentos tais como os da "Quinta Monarquia", os "niveladores", e outros, muitos dos quais diziam que o Senhor estava pronto a retornar e que era necessário transformar a ordem social, estabelecendo justiça e equidade.
Isso produziu maior intransigência por parte do Parlamento, que temia que a desordem causada pela guerra civil levasse ao caos. E o exército começou a dizer que, uma vez que nele havia uma representação mais ampla do povo, era ele, e não o Parlamento, quem podia falar em nome do povo.
Assim estavam as coisas, quando o Rei fugiu e começou a negociar com os escoceses, com os parlamentares e com o exército, fazendo a todos promessas que se contradiziam.
Por fim, chegou com os escoceses a um acordo, mediante o qual se comprometia a estabelecer o presbiterianismo em ambos os reinos (Escócia e Inglaterra), em troca de que lhe devolveriam o trono que parecia perdido. Mas, ao mesmo tempo, continuava negociando com o Parlamento. O resultado foi que, tão logo o exército conseguiu vencer os escoceses (agosto de 1648), dirigiu sua fúria tanto contra o Rei como contra o Parlamento.
Em dezembro desse mesmo ano de 1648, o exército arrebatou do Parlamento a pessoa do Rei. Uns poucos dias mais tarde, começou uma limpeza no Parlamento por parte do exército. Quarenta e cinco parlamentares foram detidos, e quase o dobro desse número ficou proibido de assistir às sessões. Dos restantes, vários se negaram a tormar parte de um corpo tão mutilado. Ao que restou, seus adversários deram o nome de "Os Restos do Parlamento" (Rump Parliament).
Esse Parlamento foi aquele que, poucos dias mais tarde, iniciou o processo contra Carlos, a quem acusava de alta trai¬ção e de haver sumido do país, na guerra civil. Os catorze lordes que se atreveram a assistir a sessão da Câmara Alta, no dia que se apresentou o processo contra o Rei, negaram-se unanimemente a dar-lhe andamento. Mas a Câmara dos Comuns, simplesmente, continou o processo, e Carlos, que recusou defender-se porque seus supostos juizes não tinham jurisdição legal, foi decapitado a 30 de janeiro de 1649.

O Protetorado
Os escoceses, temerosos por perderem sua independência, apressaram-se em reconhecer como rei Carlos II, filho do falecido rei. Os irlandeses, por seu lado, aproveitaram as circunstâncias para se rebelarem. Dentro da própria Inglaterra, os independentes se dividiam cada vez mais. Entre os mais radicais, apareceu o movimento dos diggers (escavadores), cujo profeta propunha uma nova ordem social onde havia um direito univer¬sal, não só à liberdade e ao sufrágio, mas também à propriedade.
Tais pregações também atemorizavam as classes mercantis que, até pouco antes, haviam sido um elemento importante na opo¬sição ao Rei. Os presbiterianos, por seu lado, insistiam em seu empenho de impor seu sistema de governo e sua forma de culto em toda a igreja da Inglaterra. O caos ameaçava apossar-se do país.
Foi em meio a tais circunstâncias que Cromwell tomou as rédeas do Estado. Ainda que não tivesse participado da limpeza do Parlamento, depois a aprovou e, em nome de "Os Restos do Parlamento", aniquilou primeiro a rebelião irlandesa e, logo em seguida, o pequeno monarca que havia aparecido na Escócia. Derrotado, Carlos II refugiou-se no continente. Mas tudo isso não resolvia o problema de um Parlamento que havia continua¬do por longo tempo, e cujo remanescente não representava verdadeiramente o povo. Quando esse Parlamento decidiu perpetuar-se no poder mediante um projeto de lei, Cromwell se apresentou na sala das sessões, retirou, aos poucos, deputados que ficaram e fechou o edifício com chave.
Desse modo, e ao que parece contra sua própria vontade, Cromwell tornou-se árbitro supremo dos destinos do país. Durante vários meses, buscou o modo de voltar à legalidade com o título de Protetor. Segundo o Instrumento de governo, que servia de carta fundamental da nova ordem, o Protetor governaria com a assistência de um Parlamento que representaria a Inglaterra, Escócia e Irlanda. Mas, na realidade, estes dois últimos países tinham uma representação ínfima e, em todo caso, era o Protetor quem governava verdadeiramente.
Cromwell dedicou-se inteiramente a um programa de reforma tanto na igreja como no governo. Sua política religiosa foi relativamente tolerante devido ao ambiente da época. Ainda que ele mesmo tivesse idéias independentes, tratou de criar um sistema eclesiástico em que coubiam tanto os independentes como os presbiterianos, os batistas e, até, alguns partidários moderados do regime episcopal. Como bom puritano, empenhou-se, além disso, num programa de reformar os costumes e logo ter leis sobre o Dia do Senhor, sobre as corridas de cavalos, as brigas de galos, o teatro, e outras atividades.
No campo econômico, o governo de Cromwell favoreceu a classe média em prejuízo particular a dos magnatas, mas também, em certa medida, a dos mais pobres. Entre ambos os extremos, foi crescendo a oposição ao Protetorado e as saudades da monarquia.
No campo político, Cromwell teve bom êxito, enquanto conseguiu dominar o país durante sua vida. Mas seus sonhos de criar uma república estável fracassaram. Igualmente aos reis James e Carlos, que lhe antecederam, foi-lhe difícil governar em harmonia com o Parlamento — apesar de que, quando seus partidários não gostaram do que havia sido eleito, proibiram a muitos de seus opositores ocupar seus lugares, de modo que o que existiu foi um novo "resto de Parlamento".
Convencidos da impossibilidade de manter o Protetorado, os parlamentares chegaram a oferecer a coroa a Cromwell. Mas este se negou, talvez por escrúpulos pessoais, ou por agudeza política. Em todo caso, a necessidade de chegar a considerar tal extremo mostra até que ponto tornou-se difícil instalar a república.
Em 1658, pouco antes de morrer, Cromwell indicou que seu sucessor devia ser seu filho Ricardo. Ainda que este tenha herdado o título de seu pai, precisava de seus dotes, e logo o país viu-se à beira de uma nova guerra civil. Traído e levado entre o Parlamento e o exército, Ricardo Cromwell renunciou ao protetorado e retirou-se para a vida privada.

A Restauração
O fracasso do Protetorado não deixava outra alternativa a não ser a restauração da monarquia. O general Monck, que estava no comando de uma ala do exército, marchou sobre Londres e convocou um novo Parlamento ao qual deviam assistir também os lordes. Quando essa assembleia se reuniu, começaram as negociações com Carlos II que foi restaurado ao trono, depois de ter recebido as garantias necessárias.
A restauração dos Stuart trouxe uma onda de reação contra os puritanos. Ainda que o próprio Carlos a princípio quisesse dar um lugar aos presbiterianos na igreja nacional, o Parlamento mostrou-se inclinado para o anglicanismo tradicional. Além de voltar a instaurar o episcopado e o Livro de Oração Comum, o novo governo ditou leis contra os dissidentes, para quem já não havia lugar na igreja oficial. Proibiram-se os cultos que seguiam outro ritual do que o determinado pelo governo. E os ministros que não o aceitavam eram proíbidosde pregar. Essas leis e outras de semelhante tom não conseguiram destruir a multidão de mo¬vimentos que surgiram na Inglaterra. Simplesmente, os colocaram a margem da Igreja oficial onde a maioria continuou existindo, até que voltaram a tolerá-los, já perto do final do século.
Na Escócia, a restauração da monarquia teve consequências ainda mais severas. Esse país era fortemente presbiteriano e ago¬ra, por decreto real, sua igreja fora reorganizada e colocada debaixo de um regime episcopal. Os ministros presbiterianos foram privados de seus direitos e foram substituídos por pessoas de persuasão episcopal. Prontamente, aconteceram motins e rebeliões, e o arcebispo supremo da Escócia, James Sharp, foi assassinado. Com o apoio dos ingleses, os elementos realistas esmagaram as rebeliões, cruelmente afogadas em sangue.
Carlos II declarou-se católico no leito de morte, confirmando as piores suspeitas dos puritanos perseguidos. Seu irmão e sucessor, James II, era católico e estava dedidido a restaurar o catolicismo romano como a religião oficial de seus reinos. Na Inglaterra, tratou de abrir o caminho ao catolicismo decretando a tolerância religiosa. Em sua visão, esperava ganhar com isso o apoio dos grupos dissidentes. Mas o sentimento anti-católico entre tais grupos era tal que se negaram a aceitar o edito de tolerância, ainda que os beneficiasse grandemente. Na Escócia, todavia, as condições eram piores. James II (o sétimo rei com esse nome na Escócia) decretou pena de morte para quem assis¬tisse cultos não autorizados e colocou boa parte dos assuntos do país nas mãos dos católicos. Como na Inglaterra, tratou de decretar a tolerância para com os católicos. Mas os presbiterianos escoceses, tampouco a aceitaram.
Depois de três anos debaixo de James II, os ingleses se rebelaram e convidaram a Guilherme, Príncipe de Orange, e sua esposa Maria, a ocupar o trono. Guilherme desembarcou na Inglaterra em 1688, e James fugiu para a França. Na Escócia, o partido de James subsistiu por alguns meses. Mas, no ano seguin¬te, Guilherme e Maria também foram proclamados soberanos desse país. A política religiosa de Guilherme e Maria foi, no geral, tolerante. Na Inglaterra, deu-se liberdade de culto a toda pessoa que assinasse os Trinta e nove artigos de 1562 e que jurasse fidelidade aos soberanos. Na Escócia, o presbiterianismo foi feito a religião oficial do Estado e a Confissão de Westminster, sua norma doutrinária.
Como em tantos outros países (já vimos os casos da França e da Alemanha), todas estas lutas por motivos confessionistas, levaram muitos à conclusão de que as questões doutrinárias não mereciam tanto sangue, nem tanta contenda. Logo, ainda que o resultado na área política tenha sido uma maior tolerância, isso foi possível graças à crescente indiferença em matéria religiosa. Uma vez mais, as amargas lutas sobre o dogma acabaram na dúvida.
A história do puritanismo, não obstante, não ficaria completa se não nos referíssemos, mesmo que brevemente, as suas duas grandes figuras literárias: João Bunyan e João Milton. A mais importante obra do primeiro, geralmente conhecida sob o título O Peregrino converteu-se em um dos livros de devoção mais lidos e, portanto, serviu para levar a semente puritana aos mais afastados rincões. Milton, por sua vez, é considerado um dos mais notáveis poetas da literatura inglesa, e seu Paraíso Perdido conta-se entre as obras mestras dessa literatura. Ambos, Bunyan e Milton, continuaram proclamando a mensagem puritana através das gerações.

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Sou pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil, mestrando em Divindade (Magister Divinity), pelo CPAJ (Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper). Sou também professor de História da Igreja, de Introdução Bíblica, e Cartas Gerais, na Escola Teológica Rev. Celso Lopes, em Maceió AL. Além disso, sou coronel-aviador da Força Aérea Brasileira, já reformado.

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